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setembro 2024

O que pode acontecer com Datena nas justiças eleitoral e criminal após cadeirada em Marçal? 150 150 Marzagão Balaró

O que pode acontecer com Datena nas justiças eleitoral e criminal após cadeirada em Marçal?

Especialistas ouvidos pelo g1 apontam que a legislação eleitoral não tem previsão de punição em casos de agressão física, mas andamento do caso dependerá da interpretação do Ministério Público Eleitoral; entenda.

José Luiz Datena (PSDB) agrediu Pablo Marçal (PRTB) com uma cadeirada durante debate com os candidatos à Prefeitura de São Paulo neste domingo (15), que era transmitido ao vivo pela TV Cultura.

Após o episódio, Marçal foi internado no Hospital Sírio-Libanês e recebeu alta na manhã desta segunda-feira (16). Em coletiva na saída do hospital, ele disse que a agressão “foi só um esbarrão”, classificou o episódio como deprimente e afirmou que pedirá a cassação do registro de Datena.

O advogado de Pablo Marçal registrou um boletim de ocorrência por lesão corporal e injúria contra Datena. A Secretaria da Segurança Pública confirmou que o caso foi registrado no 78° DP (Jardins).

O g1 conversou com especialistas para entender o que pode acontecer com o candidato tucano nos âmbitos eleitoral e criminal após a agressão.

Âmbito eleitoral

Sob o ponto de vista da Justiça Eleitoral, os especialistas foram unânimes: é pouquíssimo provável que Datena tenha a candidatura afetada ou cassada, por exemplo.

“A agressão física ou verbal, embora seja moralmente condenável, não é causa legalmente prevista para que o registro da candidatura de alguém seja cassado. Portanto, Datena, se quiser, poderá continuar a concorrer pelo cargo de prefeito”, afirmou Maira Scavuzzi, Advogada especialista em direito penal e constitucional

Professor de Direito Eleitoral na Escola Paulista de Direito, Alberto Rollo aponta no mesmo sentido: “Não tem nada para fazer. A lei eleitoral disciplina a organização de debate, quais são as regras, quem é obrigado a convidar ou não convidar. O resto, o comportamento, é fixado pelas empresas promotoras e as assessorias. A Justiça Eleitoral não tem nada a ver com isso”.

“O que tem nessas circunstâncias é uma agressão, ou tentativa de agressão. Portanto, é lesão corporal, é crime. Isso não influencia em nada na eleição, em nada no processo eleitoral”, completa o advogado.

“Já vi notícia que o Marçal diz que vai pedir a cassação do registro do Datena. Não tem fundamento. Isso é mais um dos recortes que ele quer fazer na internet, mas não tem fundamento”, afirma Rollo.

Bruno Andrade, coordenador-geral adjunto da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político, também diz que a agressão não coloca a candidatura de Datena diretamente em risco. “Cabe aguardar se haverá propositura de alguma ação para avaliar o contexto, avaliar se cabe ou não alguma punição no âmbito eleitoral”.

Apesar disso, segundo o jurista, a legislação traz uma previsão em relação a agressões no âmbito de campanhas eleitorais. No entanto, a possibilidade de isso afetar o tucano depende da interpretação do Ministério Público Eleitoral.

Trata-se do artigo 326, parágrafo segundo, do Código Eleitoral, que diz:

“Injuriar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro. Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou meio empregado, se considerem aviltantes: pena – detenção de três meses a um ano e pagamento de 5 a 20 dias-multa, além das penas correspondentes à violência prevista no Código Penal”.

“É difícil, mas poderia ser considerado que foi cometido o crime eleitoral de injúria com violência, que chegou às vias de fato”, aponta Andrade.

Para Alberto Rollo, a previsão legal não se aplica ao caso de Datena porque sua intenção inicial não foi de cometer um ato de injúria:

“O Código Eleitoral fala sobre praticar a injúria e usar de violência. Não foi o Datena quem praticou a injúria. Ele praticou violência, mas não foi ele quem praticou a injúria. A injúria seria o contrário: o Marçal falou que ele praticou assédio sexual, esse tipo de coisa. E ele, para reagir, usou a violência”.

No entanto, segundo o professor, as ofensas classificadas como calúnia, injúria e difamação podem ser apuradas como crimes eleitorais e implicar em sanções mais gravosas às candidaturas, já há previsão em relação a elas no Código Eleitoral.

Vânia Aieta, coordenadora-geral da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político afirma que não existe implicação eleitoral em casos de agressão. “Creio que os debates têm regras muito boas e amarradas. Trata-se de uma extraordinariedade. Pode acontecer em qualquer lugar, em qualquer situação. E não tem como evitar”.

“O que o lesado pode fazer é ingressar com as ações cabíveis, mas nada que comprometa o Datena de continuar a concorrer”, disse a especialista.

“As medidas que são tomadas ordinariamente pelas Coordenações dos Debates são suficientes e já fazem previsão de agressões, que de um modo geral espera-se que sejam tão somente verbais. Uma agressão física não chega a ser causa de impugnação do agressor. Não se trata propriamente de um crime eleitoral. O caso é extraordinário e acabou na esfera pessoal”, completou.

Diante do histórico de ânimos exaltados e da recente agressão, Bruno Andrade sugere que medidas de proteção podem ser adotadas nos próximos debates: “Seja colocando cenários que impeçam a movimentação direta dos candidatos, seja mudando o modelo para entrevistas”.

Âmbito criminal

Em relação ao aspecto criminal da agressão, os juristas também concordaram entre si ao dizer que Datena pode sofrer sanções penais em um contexto de lesão corporal dolosa contra Marçal.

“O episódio ocorrido no debate, em tese, configura o crime de lesão corporal dolosa. Se for considerada lesão corporal de natureza leve, a vítima poderá optar se vai representar contra o ofensor. Somente após essa representação o Ministério Público irá agir contra o agressor. Se a lesão for considerada grave, o Ministério Público irá processar o agressor independentemente de representação da vítima”, destacou Rodrigo Dall’Acqua, advogado criminalista, sócio do Oliveira Lima e Dall’Acqua Advogados e membro do Instituto de Defesa do Direito de Defesa.

“Uma das formas de lesão de natureza grave é aquela que causa a incapacidade da vítima para suas ocupações habituais por mais de trinta dias”, que, além do trabalho, podem ser consideradas atividades esportivas e de lazer, explica o advogado.

Dall’Acqua chamou a atenção para o fato de que as provocações de Marçal durante o debate podem beneficiar Datena, em caso de condenação: “A lei penal garante redução de pena para o agressor que age sob o domínio de violenta emoção, logo após injusta provocação da vítima”.

A advogada Maira Scavuzzi explica as diferenças entre as penas para os tipos de lesão:

“A lesão corporal simples, cuja pena é de detenção de três meses a um ano, trata-se de uma infração de menor potencial ofensivo, que admite, inclusive, transação penal para evitar que sequer seja instaurado processo contra o agressor, aplicando-se sanção de multa ou restrição de direitos, a ‘famosa cesta básica'”, apontou.

“Contudo, se em razão da violência a vítima sofrer resultados de gravidade superior — por exemplo, correr perigo de vida ou perder a função de um membro — a pena será de reclusão de um a cinco anos ou de dois a oito anos”, completou.

Raphael de Matos Cardoso, especialista em Direito Eleitoral e sócio do Marzagão e Balaró Advogados, pensa que a agressão não pode configurar, em tese, crime eleitoral, mas crime comum: “Para configurar o crime eleitoral teria que ter sido praticado na propaganda eleitoral ou visando a fins de propaganda”.

Fonte: G1

Por que algumas cidades têm mais eleitores que moradores? 150 150 Marzagão Balaró

Por que algumas cidades têm mais eleitores que moradores?

Entenda o que causa essa diferença e quando ela pode ser corrigida

Para a Justiça Eleitoral, um domicílio não se limita ao local onde alguém se estabelece definitivamente. Para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o eleitor também considera os vínculos afetivos, familiares, profissionais, comunitários ou de outra natureza ao justificar a escolha de uma cidade para residência. Por isso, o local de votação de um eleitor não precisa ser, necessariamente, o mesmo de sua moradia. É justamente por isso que o número de eleitores em determinados municípios pode superar o de moradores.

Por exemplo, a cidade de Águas de São Pedro possui quase 66% a mais de eleitores, a maior diferença no estado de São Paulo. Ao todo, a localidade conta com 4.301 votantes e somente 2.829 moradores. O mesmo acontece em Saubara, na Bahia, com 13.577 de eleitores e 11.842 habitantes, e em Arraial do Cabo, no Rio de Janeiro, com eleitorado de 36.527 e apenas 32.794 residentes.

Os dados foram obtidos através do cruzamento da estimativa de população divulgada em julho de 2024 pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), e das estatísticas do eleitorado disponibilizadas pelo TSE.

Contudo, outros fatores podem causar essa diferença. Raphael de Matos Cardoso, advogado especialista em direito eleitoral, afirma que crianças (que não podem votar), jovens entre 16 e 17 anos, analfabetos e maiores de 70 anos não são obrigados a terem título de eleitor, impactando no levantamento.

“Outro fator que pode influenciar é dos moradores que se mudam para outras cidades e demoram para transferir seus domicílios eleitorais ou nem chegam a fazê-lo”, afirma o advogado.

Quando essa diferença é encontrada, a correção ou revisão do eleitorado pode ser realizada pela Corregedoria-Geral Eleitoral, conforme o artigo 102 da resolução nº 23.659/21 do TSE. Veja abaixo as condições:

  • O total de transferências ocorridas no ano em curso seja 10% superior ao do ano anterior;
  • O eleitorado for superior ao dobro da população entre dez e quinze anos, somada à de idade superior a setenta anos do território daquele município;
  • O eleitorado for superior a 65% e menor ou igual a 80% da população projetada para aquele ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE);
  • Quando houver indícios consistentes ou denúncia fundamentada de fraude ou outras irregularidades no alistamento em zona ou município.

Fonte: Valor Econômico

Tese do STF sobre medicamentos traz obstáculos que preocupam pacientes e especialistas 150 150 Marzagão Balaró

Tese do STF sobre medicamentos traz obstáculos que preocupam pacientes e especialistas

    O Plenário do Supremo Tribunal Federal concluiu, na última sexta-feira (20/9), o julgamento de repercussão geral no qual estabeleceu critérios sobre os casos excepcionais em que o Judiciário pode determinar o fornecimento de medicamentos não incorporados ao Sistema Único de Saúde (SUS). A tese é vista por especialistas como um bom esforço da Corte, mas que cria obstáculos para os pacientes, principalmente por vincular a concessão dos remédios ao andamento da questão na Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS (Conitec).

    O fornecimento de medicamentos é um dos assuntos mais complexos e polêmicos do Judiciário brasileiro, pois afeta dezenas de milhares de processos e tem forte impacto nas contas públicas e decisões do Executivo. Muitos remédios judicializados são de alto custo — nos casos de doenças raras, as unidades têm preços na casa dos milhares ou até milhões de reais.

    Segundo a tese apresentada de forma conjunta pelos ministros Gilmar Mendes e Luís Roberto Barroso, se um medicamento não está nas listas do SUS, não pode ser fornecido por decisão judicial. Mas isso pode acontecer em situações excepcionais, desde que o remédio esteja registrado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e que sejam preenchidos alguns requisitos.

    O voto conjunto traz critérios como negativa administrativa, incapacidade financeira do paciente e medicamento eficaz, seguro, imprescindível e insubstituível. Também foram estipuladas regras a serem seguidas pelos juízes, que precisam, por exemplo, consultar órgãos técnicos.

    Entidades ligadas a pacientes com doenças raras repudiaram a decisão. Uma delas foi a Federação Brasileira das Associações de Pacientes com Doenças Raras (Febrararas). O presidente da entidade, Toni Daher, explica que a crítica da federação é a um requisito específico da tese dos ministros: a chancela da Conitec.

    Obstáculo burocrático

    Conforme estabelecido por Gilmar e Barroso, em ações judiciais sobre o tema, o autor deve comprovar que não houve pedido para incorporação do medicamento no SUS; que houve pedido, mas a Conitec está demorando para analisá-lo; ou que a comissão negou a incorporação de forma ilegal.

    A Conitec, vinculada ao Ministério da Saúde, faz análises de custo-efetividade (ou seja, leva em conta os gastos e os resultados) sobre novos medicamentos para recomendar ou não sua incorporação ao SUS.

    Para Daher, exigir que o medicamento passe pela Conitec nessas situações é discriminatório: “Se o custo é alto, o cidadão não tem mais direito?”. Ele diz que antibióticos com preços na casa das centenas de reais, prescritos para períodos longos, não passam pela avaliação da comissão, mesmo quando a questão é judicializada.

    O presidente da Febrararas também destaca a “morosidade” e a “falta de clareza” da Conitec. Segundo ele, a incorporação ao SUS após o lançamento de um novo remédio pode durar anos. Ou seja, um paciente pode não ter à sua disposição o tratamento mais atual e inovador para sua doença, mesmo que a “linha terapêutica apresente respostas mais eficazes”.

    Por exemplo, o Zolgensma (nome comercial do onasemnogene abeparvovec-xioi), considerado o medicamento mais caro do mundo (cada dose única custa até R$ 6,9 milhões para o governo) e usado no tratamento de atrofia muscular espinhal (AME), foi incorporado ao SUS em dezembro de 2022, mas ainda não está disponível para os usuários, devido a problemas na formalização do acordo com a fabricante.

    Daher questiona a atribuição do dever de avaliação à Conitec nos casos de judicialização, já que hoje o governo não consegue sequer pactuar a incorporação dos medicamentos aprovados pela comissão.

    Ele também lembra que a maioria das doenças relativas a muitos dos medicamentos aprovados não têm, até hoje, protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas (PCDT) — documentos com critérios para o diagnóstico e parâmetros para o tratamento.

    Segundo o presidente da Febrararas, a entidade presencia muitos casos de pacientes que, mesmo após terem liminares favoráveis, não conseguem aproveitar os medicamentos: “Hoje já demora. Imagina com a chancela da Conitec”.

    Segundo um levantamento feito em 2022 pelo Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma) em parceria com a consultoria Ernst & Young Parthenon, 62% dos medicamentos solicitados por meio de ação judicial já estavam presentes nas listas do SUS. Dentre os que não constavam, 73% possuíam alternativas terapêuticas já incorporadas.

    Ou seja, o problema maior, como aponta Daher, é “a gestão do sistema”, pois os medicamentos já aprovados pela Conitec não são disponibilizados nas farmácias.

    O presidente da Febrararas acredita que o STF deveria exigir do Ministério da Saúde a elaboração de um projeto de independência da Conitec. Para ele, a comissão deveria ter status de agência e contar em seus quadros com membros da sociedade científica e civil, como ocorre nos EUA e em países da Europa.

    Hoje, a Conitec é totalmente dependente do Ministério da Saúde e mais da metade de seu plenário é composto por representantes de secretarias da pasta. Daher defende a participação de especialistas em doenças raras e representantes dos pacientes

    Outro problema apontado por ele é que a Conitec só ouve o testemunho do paciente quando o relatório técnico já está pronto.

    De acordo com Daher, doenças raras são um assunto complexo e os próprios médicos geneticistas, muitas vezes, precisam estudá-las por dias para entender melhor seus efeitos. Para ele, sem especialistas que acompanham os pacientes, a situação real não é compreendida.

    Além disso, o Brasil tem poucos especialistas do tipo. Segundo dados da Sociedade Brasileira de Genética Médica (SBGM), em 2020 o país tinha 332 geneticistas — um para cada 1,25 milhão de brasileiros. A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda que haja um para cada cem mil habitantes.

    Até por isso, falta conhecimento para os juízes que decidem sobre esses medicamentos. Uma forma melhor de lidar com isso, segundo o presidente da Febrararas, é a criação de varas específicas para casos de saúde. Isso já existe no Rio Grande do Sul, no Paraná e em Goiás.

    Daher acredita que faltou, na decisão do STF, um “olhar de quem está na ponta” do tema, ou seja, de quem entende o que acontece na prática. Na sua visão, a Corte não escutou esse lado, mas apenas o do Ministério da Saúde.

    “É claro que os ministros querem fazer o melhor. Disso não tenho dúvida. Mas o entendimento das doenças raras especificamente é muito difícil para todos. Se não conversar com a ponta, não vai ter os relatos verdadeiros do que acontece”, pontua.

    Provas difíceis

    A advogada e professora Fernanda Schaefer Rivabem, pós-doutora em Bioética, diz que é difícil comprovar ilegalidade em uma decisão da Conitec, como exigido pela tese do STF, já que os pareceres são “bem técnicos”. Para demonstrá-la, seriam necessárias provas técnicas, que custam caro.

    Além disso, o critério é “abstrato demais”, pois não há especificação sobre o que configura ilegalidade. Isso “resultaria em análises subjetivas, o que pode trazer prejuízos tanto para quem pleiteia, quanto para o sistema de saúde”.

    Por isso, na sua visão, esse critério deve ser pouco utilizado. A tendência, segundo ela, é que o critério da demora na análise seja mais usado.

    Existe um site no qual é possível acompanhar o status dos pedidos de incorporação de medicamentos. Mas os motivos das rejeições são disponibilizados em outra página

    “Há uma complexidade importante”, aponta Henderson Fürst, presidente da Comissão de Bioética da OAB-SP. “Como um paciente conseguirá demonstrar a ilegalidade (que não seja apenas do prazo) na análise de uma decisão de não incorporação sem um especialista em avaliação de tecnologia em saúde para apontar o problema?”, indaga.

    O paciente precisaria de um relatório que explicasse por que a análise de incorporação da Conitec deve ser considerada ilegal. A produção desse documento demandaria um médico — que provavelmente seria do SUS. Por isso, Fürst acredita que, na prática, “isso não ocorrerá”.

    Embora considere a tese “adequada para a sustentabilidade do SUS”, Marinella Afonso de Almeida, sócia do escritório Marzagão e Balaró Advogados e especialista em Direito Médico, destaca que os PCDT “eventualmente podem não corresponder ao tratamento mais atual existente para determinada patologia”.

    Portanto, na opinião da advogada, o autor da ação “tem para si uma prova processual dita diabólica, pois tecnicamente não há como comprovar que o medicamento pleiteado seria insubstituível”.

    Segundo a tese de Gilmar e Barroso, a concessão dos remédios deve se basear “em avaliações técnicas à luz da medicina baseada em evidências”. Schaefer ressalta que, nos casos de doenças raras, “nem sempre será possível trazer estudos de metanálise ou randomizados”, pois muitas vezes eles não existem.

    Para ela, no entanto, isso não inviabiliza ou dificulta o pedido: “Apenas exige uma cautela maior na produção do material que sustenta a necessidade do medicamento”.

    Já Fürst indica que a análise, “à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco” (como previsto no voto vencedor) é justamente aquela feita pela Anvisa.

    “Se é válido que o médico assistente do paciente fundamente sua prescrição em relatório médico com base em evidências científicas, não faz sentido a determinação de que o paciente peticione demonstrando questões relativas ao medicamento cuja análise é da competência da Anvisa e que por ela já foram aceitos”, assinala.

    Competências

    Paralelamente à definição dos critérios, o STF também homologou, com alguns ajustes, três acordos feitos entre a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios, que definem a responsabilidade dos entes federativos em ações judiciais sobre fornecimento de medicamentos não incorporados ao SUS e a competência para resolvê-las.

    Conforme as propostas ajustadas, os processos devem tramitar na Justiça Federal quando o valor anual específico do remédio ou do seu princípio ativo for igual ou superior a 210 salários mínimos.

    Fürst aponta que, nesses casos, pacientes vulneráveis e dependentes das Defensorias Públicas não poderão mais usar as Defensorias estaduais (DPEs), mas apenas a da União (DPU). A instituição nacional “não possui estrutura espalhada e interiorizada pelo Brasil” — está presente em menos de 30% dos municípios brasileiros que contam com seção ou subseção da Justiça Federal.

    Para Schaefer, a falta de acesso à DPU e ao Ministério Público da União em determinados pontos do país pode prejudicar o acesso à Justiça: “Será necessário pensar rapidamente soluções para essas situações, para evitar tal desassistência”.

    Poucas mudanças

    A advogada explica que critérios como “inexistência de substituto terapêutico” e comprovação da segurança e eficácia do medicamento não são novos: “Por muitos anos vêm sendo aplicados pelo Judiciário, portanto nada muda”.

    O advogado Daniel Oliveira, fundador de um escritório que atua de forma exclusiva com direito à saúde, também aponta que esgotar todas as possibilidades de tratamentos e medicamentos disponíveis no SUS já é uma exigência do Judiciário há muitos anos.

    Ele acredita que, na prática, os pedidos continuarão sendo negados. De acordo com o advogado, os juízes podem exigir que o paciente, de início, tente as alternativas padrão do SUS e só acione a Justiça novamente mais tarde, caso o tratamento não dê resultado.

    Segundo a tese aprovada pelo STF, os juízes devem consultar o Núcleo de Apoio Técnico do Poder Judiciário (NatJus) sempre que disponível, ou outros entes e pessoas especializados na área da saúde.

    Oliveira indica que, nos casos de medicamentos contra cânceres, a maioria dos pedidos na Justiça atualmente são negados, após o NatJus alegar que o tratamento é caro demais para uma sobrevida muito pequena do paciente.

    Problemas comuns

    Ele ainda ressalta as dificuldades enfrentadas pelos pacientes atualmente, mesmo quando conseguem decisões favoráveis. “A maioria das ordens judiciais são desrespeitadas pelo SUS”, aponta.

    De acordo com Oliveira, os governos muitas vezes não cumprem o prazo determinado para fornecimento do medicamento e o Judiciário “raramente impõe multa”. Assim, os advogados precisam pedir o bloqueio de valores das contas do ente federativo. Ou seja, é preciso um esforço adicional e o novo procedimento está sujeito a mais demora.

    A maioria dos clientes de Oliveira são pacientes com câncer. Por isso, sua grande preocupação é com algo comum para tais pacientes: o uso off label dos medicamentos, ou seja, sua aplicação em doenças para as quais não são originalmente recomendados.

    O advogado lembra que alguns medicamentos considerados off label, sem registro na Anvisa, já têm registro em agências de outros países ou estudos clínicos que indicam sua eficácia. Muitas vezes, eles são a única alternativa para o paciente.

    “A burocracia e o tempo exigidos para registro de novos medicamentos na Anvisa é grande demais, o que não acompanha as novas tecnologias e descobertas na área da saúde, e irá prejudicar inúmeros pacientes”, pontua.

    O voto de Gilmar e Barroso explica que “medicamentos off label sem PCDT ou que não integrem listas do componente básico” são considerados remédios não incorporados ao SUS, para fins de aplicação da tese.

    Na interpretação de Oliveira, a decisão do Supremo traz “critérios ainda mais rígidos do que os critérios que já são utilizados”. Isso deve inviabilizar o acesso de muitos pacientes aos medicamentos não registrados na Anvisa ou não incorporados pela Conitec que “trariam resultados exponenciais para o seu tratamento”.

    Fonte: Consultor Jurídico (ConJur)

    Autonomia do paciente baseada em liberdade de crença em debate no STF 150 150 Marzagão Balaró

    Autonomia do paciente baseada em liberdade de crença em debate no STF

    No próximo dia 18/09/2024, o Supremo Tribunal Federal examinará o Recurso Extraordinário 1212272 – Repercussão Geral Tema 1069, que discute a possibilidade de pacientes Testemunhas de Jeová recusarem transfusões de sangue com base em crenças religiosas. O julgamento abordará a relação entre liberdade religiosa e direito à vida, um tema que levanta questões éticas e jurídicas complexas.

    De acordo com a advogada Marinella Afonso de Almeida, pós-graduada em Direito Médico, “as leis vigentes e a jurisprudência majoritária atual tendem a relativizar a autonomia de vontade do paciente e o dever de agir do médico em situação de iminente risco de óbito e ausência de alternativa terapêutica, inexistindo, infelizmente, segurança jurídica para que seja priorizada a autonomia do paciente em detrimento do direito à vida nessa hipótese específica”. Ela ressalta ainda que “assim, faz-se premente o posicionamento da Corte Suprema, sendo o julgamento aguardado, posto que as decisões proferidas com repercussão geral possuem efeito vinculante aos órgãos do Poder Judiciário, que, no exercício da competência jurisdicional, deverão obrigatoriamente seguir o entendimento nele firmado, promovendo-se a uniformização da jurisprudência sobre o tema e, consequentemente, maior segurança jurídica”.

    O Supremo Tribunal Federal definirá a interpretação final do tema visando garantir a observância da Constituição Federal e as diretrizes para o tratamento juridico de casos semelhantes no futuro.